Falar sobre sexualidade ainda é tabu para muitas pessoas e também para os profissionais de saúde. Não resta dúvida que a sexualidade está envolvida em muitas situações de adoecimento mental, por outro lado a sexualidade bem vivida e saudável é também fonte de proteção da saúde mental.
No transtorno bipolar, nas fases de ativação, a energia e os impulsos podem ser direcionados a várias áreas de forma intensa como compras, jogos, mudanças da aparência, atividades físicas, comida e sexo. Quando há um direcionamento desta energia para a atividade sexual a pessoa pode se expor a comportamentos de riscos sem perceber.
É importante observar a elevação desses sintomas pois, eles precedem a uma fase de ativação, mania/hipomania, e no caso da elevação do impulso para a atividade sexual pode se apresentar em um nível excessivo tendo características de hipersexualidade.
A elevação do impulso sexual pode trazer estragos em relacionamentos estáveis. É comum que muitas pessoas que sofrem com o transtorno bipolar se envolvam em encontros sexuais casuais, busque por vários parceiros, ou desenvolva interesse intenso pela pornografia ou masturbação ou ainda se coloquem em situações de indiscrição sexual. Muitos desses comportamentos podem levar a desfechos muito desagradáveis e prejudiciais tanto pessoais quanto nos relacionamentos.
À medida que os sintomas da mania/hipomania vão aparecendo devido a elevação da energia e do impulso há uma deficiência na capacidade de avaliação e percepção de riscos, o que faz com que a pessoa se coloque em comportamentos que podem ser prejudiciais. É como se o desejo sexual estivesse na quinta marcha, mas o “botão” de segurança do cérebro foi temporariamente desativado. Assim, há uma maior probabilidade de trair um parceiro amado, além de se colocar em situações inseguras e imprevisíveis e se expor a doenças sexualmente transmissíveis.
O comportamento hipersexual não controlado também pode levar a consequências emocionais dolorosas incluindo humilhação, arrependimento, culpa, vergonha. Com a hipersexualidade vem um sentimento subjetivo de perda de controle sobre o envolvimento em comportamentos sexuais que de outra forma poderiam claramente evitar e que estão completamente fora do padrão de vida desejado.
Muitas pessoas após o episódio apresentam um forte sentimento de arrependimento se questionando, “o que estava pensando quando fiz isso”, “não consigo acreditar que fui capaz”, muitas vezes sente nojo e muita vergonha de si mesmo.
O QUE VOCÊ PODE FAZER PARA EVITAR DESFECHOS DESAGRADÁVEIS?
Uma maneira eficaz é fazer um monitoramento do comportamento sexual regular com ou sem parceiro, juntamente com o monitoramento do humor. Esse monitoramento ajuda a estabelecer uma linha de base para saber quando iniciam as alterações.
É importante comunicar ao seu médico e terapeuta quando perceber que as sensações, pensamentos e percepções sobre a sexualidade regular estão começando a mudar. Nem sempre os profissionais que te acompanham irão perguntar sobre a questão, pois acabam se concentrando em outros sintomas, por isso é necessário ser claro, pode ser que haja necessidade de ajuste na sua medicação para amenizar a crise ou o impacto dela.
Em um relacionamento saudável é possível compartilhar com o parceiro(a) para o auxílio no monitoramento dos primeiros sinais e sintomas de elevação da energia e do impulso sexual para a busca de estratégias eficazes de controle.
MAS, COMO INTRODUZIR ESTA CONVERSA COM A PESSOAS COM QUEM VOCÊ SE RELACIONA?
Discutir sobre a atividade sexual no relacionamento é uma questão de respeito, assim como se conversa qualquer outro assunto da relação. O momento ideal para se ter essa conversa é nos períodos de estabilidade, pode ser estranho, mas deixar claro o que pode acontecer em um episódio de ativação e sobre as estratégias efetivas para evitar prejuízos é fundamental. Isso facilita a ajuda do parceiro(a) quando o episódio se aproximar. Ser aberto um com o outro, estabelecer limites, compreender sem julgamentos e ao mesmo tempo se protegerem de danos no relacionamento é fundamental. Faz parte do ser adulto comunicar e, comunicar bem a vivência e a experiência sexual avaliando padrões e limites que garantam a saúde do relacionamento.
Observe que, os Impulsos sexuais cada vez mais insaciáveis enviam uma mensagem de que há um episódio de humor no horizonte – assim como uma mudança de ondas suaves para ondas fortes muitas vezes pressagia uma tempestade que se aproxima. Estarem atentos a estas alterações ajuda a buscar e implantar medidas antecipadas que podem evitar ou diminuir o episódio e evitar as consequências destrutivas.
REGULE OS IMPULSOS PRATICANDO ATENÇÃO PLENA (MINDFULNESS)
A prática de mindfulness tem a intenção de aumentar a consciência de padrões de pensamentos, sentimentos e sensações corporais para produzir uma mudança na forma de se relacionar com eles.
Praticar essa mudança de perspectiva e observar sua experiência com curiosidade e compaixão permite que você se afaste e perceba que esses são apenas pensamentos fugazes em sua mente e você pode optar por não se envolver.
Prestar atenção na elevação do desejo sexual, que pensamentos, sentimentos e sensações corporais estão presentes pode auxiliar na evitação de desfechos ruins. A pausa que você faz para se observar ajuda a decidir se você quer se identificar com aquela alteração e viver o que o impulso lhe pede ou buscar outras formas saudáveis de lidar.
A prática de auto-observação e de se autoacalmar dá uma sensação maior de controle sobre as oscilações e a regulação do impulso. Prestar atenção em si, conhecer o seu funcionamento, praticar o autodiálogo construtivo, praticar técnicas de relaxamento, são recursos efetivos que auxiliam em tomadas de decisões mais acertadas para que evitar que se exponha em a situações de risco.
Mesmo sendo a hipersexualidade um sintoma muito complexo da bipolaridade, com o tratamento farmacológico, estratégias psicológicas e comportamentais através da psicoterapia é possível não se expor a situações de risco e manter o seu relacionamento saudável.
Cuide bem de você.
Se precisar de acompanhamento psicológico para se cuidar melhor fale aqui.
Lucinê Costa e Silva - Psicóloga
CRP04/22623
Comentarios